Apoiadores da Restauração do Império em 1993 - Vitória Imperial

Apoiadores da Restauração do Império em 1993

Em 1889, a monarquia foi derrubada provavelmente quando atingiu seu mais alto grau de popularidade entre a plebe negra e mestiça do país (Carvalho,1987:9; Chalhoub,1990:179). A admiração dos negros e das camadas populares, de um modo geral, se dirigia não só ao Imperador D. Pedro II, mas também à sua filha, a princesa Isabel, considerada a salvadora da "raça negra".

Após a abolição da escravatura, surgiu sob a inspiração de José do Patrocínio — abolicionista e liderança negra da época — a famigerada Guarda Negra, uma organização composta por negros libertos e capoeiras que, para demonstrar gratidão à princesa Isabel e à monarquia, reprimia violentamente todas manifestações públicas contrárias ao Império e sobretudo às atividades do Partido Republicano. Em São Paulo, o jornal A Redempção, ligado à organização abolicionista caifazes, declarava seu apoio "irrestrito" tanto à "Princesa Regente" como à Guarda Negra, cujas ações geravam um clima de pânico na elite branca republicana (Schwarcz,1987:243). Não obstante, com a proclamação da república, em 15 de novembro 1889, a Guarda Negra foi dissolvida e, sintomaticamente, outro dirigente negro monarquista, André Rebouças, parte para o exílio em Portugal, em solidariedade à família real. Já o líder negro José do Patrocínio, permanece no Brasil e adere por alguns anos ao "isabelismo".

Nos seus primeiros anos de vida, a república continuou sofrendo oposição de diversos setores políticos, dentre os quais de grupos monarquistas, que buscavam capitanear todo descontentamento popular frente aos primeiros governos republicanos (Janotti,1986). Entre os negros, esse processo não foi diferente, por exemplo, Lima Barreto — o mais popular romancista do Rio de Janeiro - alimentava verdadeira ojeriza pela República e não ocultava sua simpatia pela Monarquia (Carvalho,1987:30). Esta significativa rejeição do meio negro aconteceu, desconfiamos, porque os consecutivos governos da Primeira República levaram a cabo um projeto "civilizatório" de branqueamento do país, adotaram uma série de medidas sanitárias antipopulares e autoritárias de "limpeza" étnica do espaço urbano das grandes capitais, mas, principalmente, pelo fato do regime republicando ter abandonado a massa de ex-escravos e de seus descendentes à sua própria sorte, não lhes garantindo os plenos direitos no exercício da cidadania (como emprego, moradia, terra, educação, participação política e liberdade de manifestação cultural ou religiosa). As autoridades policiais reprimiam rispidamente as práticas do jogo do bicho, da capoeira e de qualquer religiosidade de matriz africana. 

Portanto, a república, no limite, teve uma orientação discriminatória e promoveu a marginalização do povo negro, o que gerou sérios ressentimentos e, porque não dizer, o fetiche nostálgico da ordem anterior.34
Em São Paulo, algumas frações do incipiente movimento negro organizado que surgiu no início do século XX também se alinhavam em prol do ideal monarquista. Em diversos artigos dos jornais da imprensa negra, é possível identificar um discurso explícito ou implícito de apologia desse regime político.35 Em praticamente todo 13 de Maio, estes jornais publicavam editoriais ou matérias idolatrando a figura da princesa Isabel, que recebeu o epíteto de "a redentora".36 Encontramos, outrossim, artigos de enaltecimento a D. Pedro II.37 Ainda no jornal Progresso38 encontramos a notícia de lançamento da revista Pátria Nova, ligado ao Centro Monarquista de Cultura Social e Polícia, que, no seu primeiro número, trazia uma homenagem a comemoração do 20º aniversário de D. Pedro Henrique de Orleans e Bragança, herdeiro presuntivo do trono brasileiro. Como escreve George Andrews,
ainda na década de 1930 a imprensa negra de São Paulo trazia notícias de clubes e organizações sociais monarquistas, como por exemplo: Gentileza (Progresso. São Paulo, 24 de fevereiro de 1929, p.2) e D. Pedro Henrique (Progresso. São Paulo, 28 de setembro de 1930, p.1). Quando a escola de samba Vai-Vai foi organizada em 1930, optou por colocar uma coroa no centro da sua bandeira com homenagem à monarquia. (George Andrews, 1991:43)
Portanto, quando Arlindo Veiga dos Santos entrou no cenário histórico e lançou publicamente suas idéias, na década de 1920, já havia, seja um sentimento difuso ou "caldo de cultura" anti-republicano, seja uma sólida tradição de setores da população negra no cultivo de uma representação positiva do Império e, no limite, um fascínio pela restauração da monarquia no país. 


Nesse sentido, Veiga dos Santos não inovou, mas apenas deu continuidade a essa tradição, que, por sinal, se estende até os dias de hoje. Afinal, não podemos esquecer que no plebiscito de 1993, para decidir qual era a melhor forma de governo, alguns expoentes da comunidade negra no país fizeram campanha publicitária em prol da monarquia, como a atriz Zezé Mota, os cantores Jards Macalé, Sandra de Sá e a sambista Dona Zica, então liderança do Grêmio Recreativo Escola de Samba Estação Primeira da Manqueira. Da mesma maneira, é importante assinalar que algumas instituições constituídas apenas por negros, como a Imperial Irmandade Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, do Rio de Janeiro, continuam reverenciando a memória da Princesa Isabel e mantendo fidelidade à Casa Imperial. No jornal da referida entidade, Redenção, de setembro e outubro de 1999, alardeia-se a homenagem prestada a Dna. Isabel de Orleans de Bragança, bisneta da Princesa Isabel, em cerimônia realizada na sede da irmandade, comemorativa do 13 de Maio, dia da abolição da escravatura.

Por: Thiago Araujo


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