“Estamos cansados de reviravoltas que atrapalham as conduções das nossas investigações”, diz coordenador da Lava Jato
A força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba convocou entrevista coletiva para anunciar sua irresignação à decisão liminar do Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, que suspendeu as execuções provisórias das penas de todos os condenados em segunda instância pelo Judiciário brasileiro. A decisão beneficia diretamente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros 34 condenados na Lava Jato.
Para o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, a decisão de Marco Aurélio é “totalmente equivocada; viola a decisão do próprio STF; consagra a impunidade, violando os precedentes do próprio Supremo; e contraria o princípio da colegialidade”. O procurador desabafou: “Estamos cansados de reviravoltas que atrapalham as conduções das nossas investigações. Carecemos de um sistema de precedentes que funcione. É preciso previsibilidade. Ministros isolados precisam ter reverência aos seus próprios precedentes. Essa decisão afeta a existência da lava Jato, pois sem a expectativa de punição, não há colaboração com a Justiça”.
“Órgão como o supremo é maior que suas partes. Nenhum ministro deve funcionar como ilhas isoladas”, disse o procurador. “É uma decisão isolada, de um apenas ministro e não vai resistir à reavaliação do próprio Supremo. Reiteramos a confiança de que o STF a reverterá em tempo hábil”, disse, citando que cabe à Procuradoria Geral da República recorrer da decisão.
Questionado se a indignação da força-tarefa tem relação direta com a situação de Lula, preso desde abril, na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, Deltan afirmou que os efeitos da decisão vão muito além de Lula. “Tem implicação, no Lula, mas se estende por diversos presos, inclusive traficantes e criminosos violentos. Mas tem efeito especial em criminosos do colarinho branco, que são os presos mais poderosos, com ilimitada capacidade recursal”.
O procurador Roberson Pozzobon reforçou que a decisão pode atingir até 240 mil presos sem condenação transitada em julgado no Brasil, podendo gerar a soltura de réus violentos ou que ameacem a ordem pública. “Mas afeta intrinsicamente réus poderosos, que são os que podem manejar todos os meandros do sistema jurídico, eternizando processos”, disse. Ele lembrou que a questão da execução da pena em segunda instância foi debatida quatro vezes em dois anos no plenário do Supremo. “E, agora, sem nenhum fato novo, no último dia de trabalho forense do ano, o ministro defere essa liminar”.
Segundo a força-tarefa, réus como Delúbio Soares, Ronam Maria Pinto e Jorge Zelada, entre outros, seriam beneficiados pela decisão. “Temos 35 réus condenados em segunda instância, mas alguns deles também têm mandados de prisão preventiva, mas até essas prisões, agora, poderão ser contestadas”, disse o procurador Diogo Castor de Matos.
Questionado sobre o mérito da prisão em segunda instância e o risco de se manter preso um réu que, posteriormente possa ser inocentado por tribunais superiores, Dallagnol disse que a princípio da presunção de inocência é compatível com a execução provisória das penas. “É o desejo da sociedade de ver o fim da impunidade. E a constituição permite diversas interpretações e, ao se fazer qualquer interpretação, é preciso analisar o efeito social dessa decisão. O princípio da presunção de inocência convive com a execução em segunda instância em diversos países do mundo. A questão é saber que tipo de país que nós queremos: um país consagrado pela impunidade, ou um país em que a lei vale para todos e as pessoas que cometem crimes sejam responsabilizadas por seus atos”.
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